quarta-feira, 24 de dezembro de 2014

O Menino que não gostava do Natal

A minha prenda vem embrulhadinha no conto O Menino que não gostava do Natal do Pedro Emanuel Santos que tive a honra e o prazer de ilustrar, para a revista MUTANTE. Um conto que conta o ESSENCIAL do Natal. 

Desejo-vos um Feliz Natal cheio de trevos, verdes esperança, e corações quentes, de um vermelho bem vivo.

Muito obrigada Pedro Emanuel Santos.

O Menino que não gostava do Natal

ou o menino que não sabia sorrir.
I
Havia um menino que não sabia sorrir. Um menino que não gostava do natal. Achava que o natal doía.
Lá em casa eram três: ele e os pais. Tinham apenas uma televisão, muito pequena. Quase sempre ouviam televisão. Ouviam, porque raramente viam. A imagem era péssima, e poucas vezes surgia. Isso não o incomodava, pois não gostava das publicidades. Quando, ao jantar, por alturas que antecipavam o natal, passavam incansavelmente anúncios de brinquedos, o menino reparava na forma como o pai olhava para a mãe e, de seguida, baixava os olhos. O pai ficava triste, pois não os podia comprar. Isso doía no pai. Doía na mãe. E doía no menino.
Sabia que quando chegasse à escola, depois das férias de natal, todos se “gabariam” do que haviam recebido. Mas ele não os invejava. O menino não pedia nada. Sabia que as coisas são como são, e não se queixava. Apenas doíam, e não sabia sorrir.
É altura de festa, esperança, de paz e amor – diziam – mas o menino não entendia. Para ele, eram apenas luzes por todo o lado. Roupas novas e alegria (nos outros). Até os sem abrigo tinham dias diferentes, por esta altura. Comiam todos juntos em grandes espaços. Mas onde será que jantariam nos outros dias? – questionava-se – Talvez não tenham muita fome, como eu – pensava ele.
Diziam que há muitos anos por esta altura o menino Jesus nasceu, e também ele teve prendas. Porque não teria ele também as suas? Será culpa dos reis que já não existiriam? Ou das estrelas que não os saberiam guiar até sua casa? Talvez fosse isso. Até porque a sua casa era muito pequenina e pobre. Pelo menos eu não preciso de animais para me aquecerem – pensava para si – pois acendo o lume. E nisto, quase esboçava um sorriso. Mas apenas físico. Diziam que as pessoas podiam sorrir por dentro. Ele, apenas conseguia sorrir por fora, e só quando necessário. Por dentro não sabia. Não conseguia.
Pensava ainda: a culpa também poderia ser dos adultos que se portaram mal, e gastaram todo o dinheiro que havia. Até que tiveram que vir os homens estrangeiros, carecas, de fato e gravata, pôr ordem na casa – como dizia o seu pai. Acho que eles também não sabiam sorrir. E eles também não devem ser muitos bons na matemática, pois o meu pai diz que colocaram apenas alguns, a pagar por todos. Se calhar, tinham uma professora má, como a minha. Não sabe explicar muito bem, pois está cá há pouco tempo.. e vai já embora, para outra ponta do país…
II
Noite de natal. Não percebo porque os meus pais sorriem tanto. Nunca o fazem.
O pai terminou a sopa. A mãe também. E não tiram os olhos de mim.
Temos uma prenda – disseram.
Prenda? respondeu o menino.
Sim! Aliás, duas: o pai já tem emprego, e…
E a outra é que… Vais ter uma irmã.
Paz, esperança, amor… e natal.
Pela primeira vez tudo fez sentido.
O menino sorriu.





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